terça-feira, 29 de outubro de 2013

Desenho (10º ano)-Trabalho 5: Desenhar com papel

Vamos experimentar uma técnica que tem por base o recorte e colagem.
Vamos procurar formas de representar a figura humana.
O resultado poderá ser uma figura bem evidente…
… ou mais ambígua e desconcertante.

Proposta de trabalho
1ª tarefa
Sobre um suporte de tamanho A4 executa um trabalho de recorte e colagem.
Deves criar um par de figuras antropomórficas.

antropomórfico
(antropomorfo + -ico
1. Que é semelhante ao homem.

2. Que tem forma humana.
3. Relativo a antropomorfo ou a antropomorfismo.


Toma em consideração as diferentes partes que constituem o corpo humano:
  • Cabeça
  • Tronco
  • Membros 


Procura criar duas figuras dinâmicas que transmitam alguma sensação de movimento.


Os elementos que seleccionares não têm de ser, obrigatoriamente, partes do corpo correspondentes.
Podes utilizar objectos, partes de outros animais ou, simplesmente, elementos recortados ou rasgados que simbolizem as partes do corpo que queiras representar.
Seja qual for a tua opção de construção da forma, esta deverá sempre destacar-se claramente do fundo.
O fundo será o branco da folha que vai servir de suporte à colagem.
Proposta de trabalho
2ª tarefa
Sobre um suporte de tamanho A4 executa um desenho que reproduza o mais fielmente possível as figuras que criaste na tarefa anterior.
Podes recorrer à técnica de decalque para encontrar, pelo menos, o contorno exterior das formas que criaste na colagem.
Utilizando lápis de cor e lápis de grafite reproduz, com o máximo de pormenor que fores capaz, os diferentes elementos que constituem a tua colagem.









quinta-feira, 30 de maio de 2013

Cultura da catedral - Ficha de Trabalho

Curso Profissional de Animação 2D 3D
História da Cultura e das Artes – Módulo 4 – A Cultura da Catedral
Ficha de trabalho
As tuas respostas devem ser registadas numa folha A4 pautada ou quadriculada

No século XII a Europa conheceu um lento crescimento económico.
O desenvolvimento das técnicas e processos agrícolas* permitiram uma produção excedentária o que levou a um crescimento demográfico com vantagens para as condições de vida da população.
A indústria e o comércio voltaram a desenvolver-se e deu-se o reaparecimento das feiras que impulsionaram o crescimento das cidades.

1.No contexto acima descrito, surgiu nas cidades (burgos) uma nova classe social que veio a ganhar grande protagonismo. Qual a designação dessa classe social?

2.Os senhores feudais perderam poder político e económico. Explica porquê.

Mas o crescimento da Europa medieval conheceu períodos de grandes dificuldades. Vários factores contribuíram para uma séria recessão económica em meados do século XIV.
A Peste Negra, trazida do Oriente, provocou uma grande quebra demográfica pois matou entre um terço a metade da população europeia.

3.A Peste Negra foi uma pandemia. Explica o que entendes por pandemia.

4. Escreve um pequeno texto no qual exponhas a tua visão pessoal sobre o surto de Peste Negra na Europa do século XIV e as suas consequências sobre o modo de viver e pensar das populações afectadas.

A partir do século XII o mundo urbano renasceu na Europa, após séculos de ruralidade.
As cidades voltaram a dinamizar a vida económica, social e cultural, enfraquecendo o poder e a importância dos senhores feudais.

5. Caracteriza de forma sumária uma cidade medieval indicando os aspectos que te pareçam mais significativos (edifícios e espaços urbanos).

O renascimento das cidades criou também uma nova cultura popular, mais profana e humanista, que se fez notar primeiramente nas cidades. Foi uma cultura essencialmente oral, gerada nas muitas festas e romarias que nessa época se organizavam.

6.Era comum representarem-se autos. Explica o que entendes por auto.

7. Nos meios cortesãos começaram a gerar-se novas regras sociais. Caracteriza sumariamente essas novas regras.

A catedral foi, nesta época, o símbolo das cidades e o motivo de orgulho dos seus habitantes que participavam activamente na sua construção. O estilo arquitectónico dessa catedrais foi designado como gótico.

8.De que forma participavam os habitantes da cidade na construção da sua catedral?

Observa atentamente a imagem.


9.Partindo da observação da imagem caracteriza o aspecto exterior da catedral gótica.



quarta-feira, 29 de maio de 2013

O vitral (Catedral 6)

A palavra vitral usa-se para designar uma vidraça feita de múltiplos pedaços de vidro colorido que compõem cenas e personagens que ganham brilho e visibilidade quando a luz do sol a atravessa, iluminando o interior.

Os vitrais góticos substituíram as pinturas a fresco que caracterizaram os interiores dos templos românicos, mantendo uma função didáctica, representando principalmente cenas religiosas do Antigo e do Novo Testamento

Os vitrais têm um aspecto marcadamente linear visto que os vidros são unidos com caixilhos de chumbo. Os vidros são, predominantemente, de cores primárias (vermelho, amarelo e azul) e compõem cenas complexas e densas que se adaptam à forma e espaço das aberturas (janelas) a preencher.

Os vitrais conferiam à Casa de Deus uma atmosfera luminosa que permitia o ambiente místico tão desejado pela religiosidade da época.


Arte gótica - Arquitectura Religiosa (Catedral 5)

A arte gótica caracteriza-se pela sua verticalidade, pela luz (associada à ideia de Deus) e por uma extraordinária atenção ao detalhe.

A catedral gótica é a casa de Deus, por excelência, ligação entre o Céu e a Terra.

A fachada, ladeada por duas torres ascendentes, evoca a ideia de Porta do Céu, magnífica entrada do Paraíso.

A iconografia* da porta principal harmoniza a governação das coisas do espírito e das coisas terrenas (representando profetas e reis) bem como glorifica Cristo e Maria.

Iconografia*
s.f. Estudo dos assuntos representados nas obras de arte, de suas fontes e de seu significado.

A nave central, através da sucessão das suas arcadas, conduz o visitante até ao altar, situado na abside.
O olhar sobe até à abóbada inundada de luz que representa a concepção gótica de Deus e simboliza a glória da Sua presença.

Arquitectura
A arquitectura gótica teve na catedral urbana a sua melhor forma de expressão.

Do ponto de vista construtivo, o gótico não se apresenta como um estilo novo, pois nasceu da evolução técnica dos métodos de construção do românico. Mantém a planta em forma de cruz com 3 ou 5 naves, o transepto, a abside, mas revela novas formas de conceber o espaço através da utilização do arco quebrado ou arco em ogiva, a sua principal invenção técnica.

Adoptado nas construções, este novo arco, mais elástico e flexível, permitiu criar novas formas de cobertura; as abóbadas de cruzaria de ogivas.

Virtualmente mais leves, as abóbadas ogivais puderam ser construídas a níveis cada vez mais altos, o que agradava à estética da época.
Isso obrigou ao reforço dos apoios exteriores, aparecendo assim um novo tipo de contraforte, mais esbelto e elegante.
Este era constituído por um elemento maciço e vertical, o botaréu, que se conjugava com os arcobotantes, meios arcos que ligavam a abóbada central ao botaréu.

Os arcobotantes transferiam para os botaréus (e destes para os alicerces, no chão) as pressões exercidas pelas abóbadas, tornando possível o seu extraordinário equilíbrio.

Esta técnica construtiva exigiu conhecimentos avançados, sofisticadas maquinarias e, sobretudo, uma correcta concepção prévia de toda a obra.

Foi graças a estas novas técnicas que a arquitectura gótica conseguiu concretizar os novos princípios estéticos que tanto a caracterizam:
-          maior verticalidade
-          amplitude dos espaços internos
-          luminosidade conseguida pelas amplas janelas preenchidas com vitrais, que rasgavam as paredes de um pilar a outro.






A Cultura Cortesã (catedral 4)


O renascimento das cidades criou também uma nova cultura popular, mais profana* e humanista, que se fez notar primeiramente nas cidades. Foi uma cultura essencialmente oral, gerada nas muitas festas e romarias que nessa época se organizavam.

*Profano
adj. Que é estranho, que não pertence à religião. / Que viola a santidade de coisas sagradas. // Música profana, a que não é religiosa. 

Era comum fazerem-se procissões e representarem-se autos*, seguidos de danças e cantares animados por menestréis*, jograis e artistas de circo que se exibiam nas ruas e nas praças.

*Auto
s.m. Peça teatral em forma poética, de origem medieval, que focaliza temas religiosos e profanos. Criação essencialmente popular, apresenta uma linguagem que integra vocabulário e expressões consagradas pelo povo. Divide-se em partes declamadas, bailados e cantos, geralmente acompanhados por pequenos conjuntos musicais.

*Menestrel
s.m. Músico-poeta ambulante da Idade Média.

Os textos desses cantares eram poesias simples ditos na língua vulgar e acompanhados por música. Falavam da amor ou brincavam com situações e figuras do quotidiano. Assim surgiu o primeiro género das literaturas nacionais europeias: a poesia trovadoresca (em Portugal as cantigas de amigo, de amor e de escárnio e maldizer).  Trovadores profissionais levaram este género para os serões das cortes reais.

A época gótica conheceu uma suavização dos costumes e das mentalidades, facto para o qual a Igreja muito contribuiu, instituindo um novo código de cavalaria, que fazia do guerreiro um paladino da paz e da justiça, em nome de Deus.

Os grandes e poderosos da época, nobres e eclesiásticos, cultivaram o conforto e o luxo (na habitação, no vestuário e na mesa) a par do prazer e da diversão.

Praticavam-se jogos guerreiros (justas*, torneios e caçadas), que mantinham a actividade física e das armas em tempo de paz, e faziam-se saraus* nos palácios, com banquetes, bailes, declamação de poesia, sempre acompanhada por música e representações teatrais.

*Justa
s.f. Combate entre dois cavaleiros armados de lança. / Duelo, torneio. 

*Sarau
s.m. Reunião festiva, à noite, para dançar, ouvir música e conversar. / Reunião noturna, de finalidade literária

Nos meios cortesãos* começaram a gerar-se novas regras sociais, pautadas por uma apresentação física mais cuidada e pela maior civilidade e cortesia no falar e no agir.

*Cortesão
adj. e s.m. Que ou aquele que pertence à corte; palaciano; Adj. Gracioso nas maneiras e palavras, delicado, elegante. S.m. Aquele que procura agradar com lisonjas e adulações. / Homem cortês e afável.

Cortesia
s.f. Maneiras delicadas, urbanidade, civilidade, polidez, afabilidade: receber com cortesia. / Saudação, cumprimento respeitoso; mesura. // Fazer cortesia com chapéu alheio, mostrar-se pródigo à custa de outrem.



A Europa das cidades, das catedrais e das universidades (catedral 3)


A partir do século XII o mundo urbano renasceu na Europa, após séculos de ruralidade.
As cidades voltaram a dinamizar a vida económica, social e cultural, enfraquecendo o poder e a importância dos senhores feudais.

A cidade
 As cidades medievais (ou burgos) eram sempre espaços fechados, rodeados por muralhas. As suas portas eram vigiadas por forças armadas e fechadas durante a noite. A partir do século XII, o crescimento das populações fez transbordar os velhos burgos que se expandiram para fora das muralhas.

Na maior parte das cidades medievais o urbanismo era bastante confuso. Estava dependente da topografia da zona e da localização de edifícios importantes como as catedrais, os palácios urbanos ou as sedes das Corporações.

Estes edifícios localizavam-se normalmente em torno de grandes espaços livres – as praças – a partir das quais se rasgavam as ruas onde se situavam as casas de habitação. Estas ruas, estreitas e tortuosas, iam desembocar nas portas das muralhas.

As praças ocupavam um lugar de destaque. Eram os centros da vida quotidiana. Aí se instalava o pelourinho* (símbolo da autoridade pública), o mercado e também se realizavam as festas e os actos importantes da vida do burgo.

*pelourinho
s. m. Coluna de pedra, erigida em lugar público, junto à qual se expunham e castigavam os criminosos. 

A cidade era um mundo barulhento e fétido, pois a maior parte das casas era de madeira e colmo, sem água canalizada nem saneamento básico. Estas condições tornavam-na insalubre* e facilitavam a ocorrência de incêndios e outras calamidades* urbanas.

*Insalubre
adj. Que não é salubre; doentio, prejudicial à saúde.

*Calamidade
s.f. Desgraça pública, catástrofe, desastre: a fome, a guerra são calamidades.
Infortúnio que atinge uma pessoa ou um grupo de pessoas.

A Universidade
As cidades com universidade tornaram-se centros culturais movimentados que atraiam estudantes das mais variadas paragens.

Entre as mais importantes universidades gerou-se um intercâmbio de mestres e alunos, permitindo a circulação de ideias e de saber. Eram frequentadas por alunos laicos*e eclesiásticos*, embora os professores (mestres) fossem membros do clero.

*Laico
adj. Característica do que ou daquele que não faz parte do clero; que não pertence a instituição ou ordem religiosa: empresa laica; escola laica; Estado Laico.

*Eclesiástico
adj. Que pertence à Igreja.
S.m. Homem dedicado ao serviço da Igreja.

As  universidades urbanas acabaram por suplantar a importância cultural dos mosteiros da época românica. Estas escolas ministravam um currículo que se iniciava pelo estudo
das Artes ou Saberes, agrupadas em duas áreas: o trivium, constituído pela Gramática, Retórica  e Dialética e o quadrivium que englobava a Aritmética, a Geometria, a Música e a Astronomia.

Gramática
Conjunto de princípios que regem o funcionamento de uma língua. A gramática orienta como as palavras podem ser combinadas ou modificadas para que as pessoas possam comunicar-se com facilidade e precisão.
Retórica
Filosofia. Arte de bem falar, de valer-se da eloquência ou da argumentação clara para se comunicar.
Retórica. Reunião de regras relativas à eloquência: a retórica era valorizada ao extremo entre os antigos.
Dialética
Arte de argumentar ou discutir.
Maneira de filosofar que procura a verdade por meio de oposição e conciliação de contradições (lógicas ou históricas).
Aritmética
Ciência que estuda as propriedades elementares dos números racionais.
Geometria
Parte da matemática que tem por objeto o estudo rigoroso do espaço e das formas (figuras e corpos) que nele se podem conceber.
Música
Arte de combinar harmoniosamente os sons; combinação de sons a fim de torná-los harmoniosos e expressivos. 
Astronomia
Ciência que estuda a posição, os movimentos e a constituição dos corpos celestes.
Astronomia matemática, a que trata do cálculo das forças que atuam sobre os astros.
Astronomia física, a que estuda as condições físicas dos astros.

Só após estas aprendizagens o aluno podia seguir para as faculdades de grau superior como Direito, Medicina e Teologia.

Direito
Complexo de leis ou normas que regem as relações entre os homens.
Ciência que estuda essas normas.
Medicina
Ciência que tem como objeto a conservação e o restabelecimento da saúde: estudante de medicina; doutor em medicina.
Teologia
Estudo da religião e das coisas divinas. A palavra vem do grego theos, que significa Deus, e logos, descrição, e refere-se apenas à interpretação da doutrina de Deus. Mas a teologia moderna abrange o estudo das várias religiões e a relação entre religião e necessidades humanas.

A Catedral*
A catedral foi, nesta época, o símbolo das cidades e o motivo de orgulho dos seus habitantes que participavam activamente na sua construção.

*Catedral Igreja principal de um bispado ou arcebispado, onde a autoridade eclesiástica tem sede.

Os mais pobres participavam como artesãos ou serventes de vários ofícios, ofereciam a força do seu trabalho. Os mais ricos (reis, bispos, nobres, mestres das corporações e grandes mercadores) contribuíam com doações em dinheiro, ofereciam a sua riqueza.

A catedral era obra de todos, expressão da comunidade que se revia na sumptuosidade e beleza do edifício, como se este fosse o reflexo da sua vitalidade.

A catedral representava o poder político-religioso de reis, bispos e dos senhores das cidades, os burgueses mais abastados e influentes.
Nesta época desenvolvem-se e aplicam-se novos métodos construtivos, de acordo com as intenções dos criadores das catedrais que hoje conhecemos pela designação de estilo gótico.

Um imenso espaço interior, elegância e luminosidade: a catedral gótica é a nova casa de Deus.
Vista interior da abside da Catedral de Colónia, na Alemanha.



quarta-feira, 22 de maio de 2013

A Cultura da Catedral (2) A Peste Negra


Peste negra é a designação pela qual ficou conhecida, durante a Idade Média, a pandemia* de peste bubónica que assolou a Europa durante o século XIV e dizimou entre 25 e 75 milhões de pessoas (este número representa um terço da população da época).

*pandemia
(grego pandemía, -as, o povo inteiro)
s. f. Surto de uma doença com distribuição geográfica muito alargada.

Trazida do Oriente, teve o seu primeiro porto de entrada em Messina, na Itália, através dos barcos de comércio. O portador da doença terá sido a pulga do rato preto, originário da Ásia.

As pessoas infectadas (por picada ou por via oral) manifestavam sintomas invulgares que começavam por pequenas manchas negras à volta de cada picada de pulga, gânglios inflamados no pescoço, nas axilas e nas virilhas, febres altas, calafrios e enjoos.
A progressão da doença era de tal ordem que, num ou, no máximo, em dois ou três dias, o doente morria.

Uma das maiores dificuldades era dar sepultura aos mortos:
"Para dar sepultura à grande quantidade de corpos já não era suficiente a terra sagrada junto às Igrejas; por isso passaram-se a edificar igrejas nos cemitérios; punham-se nessas Igrejas, às centenas, os cadáveres que iam chegando; e eles eram empilhados como as mercadorias nos navios".

Em Avignon, na França, vivia Guy de Chauliac, o mais famoso cirurgião dessa época. Ele sobreviveu à peste e deixou o seguinte relato:
“ A doença era tão contagiosa que se propagava rapidamente de uma pessoa a outra; o pai não ia ver seu filho nem o filho a seu pai; a caridade desaparecera por completo".
E continua:
“Não se sabia qual a causa desta grande mortandade. Em alguns lugares pensava-se que os judeus haviam envenenado o mundo e por isso os mataram”.

“No ano do Senhor de 1349 (…) Os vivos mal chegavam para enterrar os mortos (…) Mas, coisa temerosa de ouvir, os cães, os gatos, os galos e as galinhas e todos os animais domésticos sofriam a mesma sorte. (…) A este mal acrescentou-se outro: correu o rumor que certos criminosos, particularmente judeus, deitavam nos rios e nas fontes venenos que faziam engrossar a peste. Por isso, tanto cristãos como judeus inocentes foram queimados, mortos, quando é certo que tudo aquilo provinha da constelação ou de vingança divina*.”
 Papa Clemente VI, Prima Vita

* Os fracos conhecimentos científicos não permitiam aos nossos antepassados compreender a origem da doença.

“Digamos antes de mais que a causa longínqua e primeira deste peste foi e é ainda alguma constelação celeste (…) a qual conjunção dos astros, com outras conjunções e eclipses, causa real da corrupção mortífera do ar que nos rodeia, pressagia a mortalidade e a fome.
Não podemos deixar de dizer que, quando a epidemia procede da vontade divina, não temos outro conselho a dar que o de recorrer humildemente a essa vontade, sem desprezar contudo as prescrições do médico.”
Opinião da Faculdade de Paris da época

Outras reacções irracionais foram as manifestações de expiação que se multiplicaram um pouco por todo o lado.
Em 1349, pelo São Miguel, mais de 600 homens vieram da Flandres a Londres (…) onde se mostravam solenemente duas vezes por dia, vestidos somente da cintura aos tornozelos (…). Cada um tinha na mão direita um chicote com 3 pontas e, em cada uma delas, um nó com pregos aguçados. Marchavam em fila e batiam os seus  corpos nus e em sangue (…).”
R. d’Avesbury, Vida de Eduardo III

Os médicos e os farmacêuticos desconheciam as causas da doença e não sabiam como tratá-la. Julgavam que se estivessem totalmente vestidos, com luvas, botas e uma máscara, semelhante à cabeça de uma ave, estariam imunes.

Prevenção
Evitar o contacto com roedores e erradicá-los das áreas de habitação é a única protecção eficaz. O vinagre foi utilizado na Idade Média, já que as pulgas e as ratazanas evitam o seu cheiro.
A peste é de comunicação obrigatória às autoridades.
Tratamento
Os antibióticos revolucionaram o tratamento da peste, tornando-a de agente da morte quase certa em doença facilmente controlável.

 Texto retirado do manual da Porto Editora e colado com excertos recolhidos na Wikipedia

sábado, 18 de maio de 2013

A Cultura da Catedral (1) Aspectos gerais


No século XII, a Europa feudal conheceu um lento crescimento económico.
O desenvolvimento das técnicas e processos agrícolas* permitiram uma produção excedentária o que levou a um crescimento demográfico com vantagens para as condições de vida da população.

*afolhamento, adubagem, alfaias de ferro, moinho de vento e de água, etc

A indústria e o comércio voltaram a desenvolver-se e deu-se o reaparecimento das feiras que impulsionaram o crescimento das cidades.
Tudo isto contribuiu para o aparecimento de uma economia de mercado, onde a circulação da moeda, a movimentação dos produtos e o poder de compra, especialmente da elite aristocrática, permitiram o nascimento de uma economia monetária e capitalista.

É neste contexto que surgem os cambistas e os bancos privados que, com várias filiais em diferentes países, recebiam depósitos, faziam empréstimos, realizavam operações de câmbio (cheques e letras), que facilitavam as trocas comerciais e evitavam o transporte de moeda.

Esta expansão capitalista provocou grandes alterações sociais e políticas. A burguesia (os habitantes dos burgos ou cidades) cresceu, tornou-se mais culta e procurou deliberadamente o lucro e o enriquecimento.
Os burgueses uniram-se em organismos profissionais – as corporações ou mesteres de artes e ofícios para os artesãos e as guildas ou hansas, para os comerciantes.

Os reis encontraram na burguesia um importante aliado. Concederam às suas organizações estatutos jurídicos próprios em troca do apoio dos burgueses à centralização do seu poder.
A esta emancipação da burguesia juntou-se a emancipação das próprias cidades que se libertaram do poder dos senhores feudais.

Apoiando habilmente a luta da burguesia contra a aristocracia, a pessoa do rei aliou-se à igreja e impôs o seu papel de herdeiro e representante de Deus na Terra, de garante da paz pública, de centralizador do poder político e administrativo e de juiz - foi o despertar da realeza.

As sociedades europeias da época organizaram-se sob diferentes regimes políticos: monarquias hereditárias (reinos de Portugal, Leão, Castela, França, Inglaterra…), estados teocráticos (Sacro Império Romano-Germânico, Estado Papal), principados e repúblicas governados por elites aristocráticas ou burguesas na Itália e as cidades-Estado do norte da Alemanha e da Holanda.

Mas o crescimento da Europa medieval conheceu períodos de grandes dificuldades. Vários factores contribuíram para uma séria recessão económica em meados do século XIV (alteração dos preços dos cereais, crescimento urbano desequilibrado e consequentes fomes).


Mas foi a Peste Negra, trazida do Oriente, que provocou a maior quebra demográfica pois matou entre um terço a metade da população europeia. Provocou o pânico que, a par das guerras e da desorganização produtiva esteve na base de inúmeras revoltas populares.


A Europa só viria a recuperar desta depressão no início do século XV devido ao maior dinamismo produtivo da Itália e da Flandres e, posteriormente, à abertura marítimo-comercial feita por portugueses e espanhóis. 


quarta-feira, 8 de maio de 2013

10º F - A Cultura do Mosteiro – Ficha de Trabalho



Lê atentamente os textos deste Blogue marcados com a etiqueta 10f cultura do mosteiro.
Responde às questões a seguir colocadas numa folha A4. As tuas respostas devem ser manuscritas. A ficha deverá ser entregue na próxima 2ª feira dia 13 de Maio.

No ano de 476 d.C o Império Romano do Ocidente chegou ao fim com o saque de Roma.
O embate entre o mundo romano em declínio e o mundo bárbaro, em ascensão, alterou por completo o panorama da Europa nessa época.

1.Quais foram as principais consequências da desagregação do Império Romano do Ocidente em termos económicos e sociais?

2.Qual a designação do sistema de organização política e social que vigorou na Europa ao Longo da Idade Média?

3.Quais as classes sociais que então se estabeleceram?

4.Explica por palavras tuas o que entendes por “cristandade”.

O mundo romano tinha sido alfabetizado, com escolas e bibliotecas públicas em todas as cidades. As ideias circulavam facilmente entre o Ocidente e o Oriente.
Com as invasões bárbaras muitas cidades foram pilhadas, devastadas e incendiadas, perdendo-se, entre outras coisas, as suas escolas e bibliotecas.

5.Como consequência dos factos acima registados qual foi o papel do clero na preservação do conhecimento?

A arte românica é considerada como o primeiro estilo internacional da Idade Média.

6.Explica o que entendes por estilo.

Essas poderosas e desafiadoras montanhas de pedra erguidas pela Igreja em terras de camponeses e guerreiros recentemente convertidos do seu modo de vida pagão parecem expressar a própria ideia da Igreja militante – isto é, a ideia de que aqui, na Terra, é tarefa de Igreja combater as forças das trevas até que soe a hora do triunfo, no dia do Juízo Final.

7.O texto refere-se às igrejas e catedrais românicas. Enumera as principais características dessas construções.

Foi em França que as igrejas românicas começaram a ser decoradas com esculturas embora a palavra “decorar” nos possa induzir em erro.

8.Qual a razão que leva o autor do texto a afirmar que a palavra “decorar” nos pode induzir em erro quando nos referimos à escultura (nomeadamente ao relevo) utilizada nas igrejas românicas?

A pintura mural do período românico exerceu uma função semelhante à do relevo.

9.Que função semelhante à do relevo foi exercida pela pintura mural?

A pintura sobre os livros sagrados (iluminuras) foram outra importante forma de expressão desenvolvida ao longo de toda a Idade Média.

10.Explica qual a razão que te parece justificar o facto de as figuras humanas representadas na arte românica serem tão toscas e desproporcionadas.






domingo, 5 de maio de 2013

Românico - As Artes da Cor (A Cultura do Mosteiro-8)


A pintura mural do período românico exerceu uma função semelhante à do relevo no seu carácter doutrinal e pedagógico.
Estas pinturas revestiam os interiores, das absides aos pórticos de entrada.

A pintura e a escultura contribuíam para reforçar o ambiente místico que se pretendia atribuir à Casa de Deus, criando dentro das igrejas um espaço de encantamento e surpresa.
Comparativamente à escultura são poucos os exemplos que hoje restam da pintura mural românica devido à degradação provocada pelo tempo.

No caso da pintura prevalece a temática religiosa com representações de cenas dos evangelhos e das vidas dos santos. A falta de naturalismo do desenho anatómico não retira expressividade a estas pinturas apesar de, aos nossos olhos, poderem parecer algo ingénuas.

A iconografia do Cristo em Majestade cobria a superfície  da abside do altar-mor em muitas igrejas.  A Sua figura dominava o espaço centralizando a atenção dos fiéis durante a liturgia.
Cristo era juiz e imperador, detentor de todo o poder e sabedoria.


A pintura sobre os livros sagrados  (iluminuras) foram outra importante forma de expressão desenvolvida ao longo de toda a Idade Média.

Estes livros eram produzidos nos scriptoria dos mosteiros por monges especializados. Eram produtos raros e preciosos, destinados a uma restrita clientela de eruditos. Daí que as iluminuras tenham um carácter narrativo menos popular e imediatista que as outras formas de expressão atrás abordadas.

Estas pinturas podiam ocupar páginas inteiras com ilustrações dos textos que acompanhavam ou reduzir-se à decoração de letras iniciais dos capítulos ou parágrafos (capitulares).

As técnicas utilizadas denotam uma extraordinária destreza na execução e uma imaginação sem limites traduzida na variedade de temas, na fantasia das formas e na riqueza do colorido.

A pintura estava a caminho de se converter numa forma de escrita por imagens.
Esse recurso a métodos mais simplificados de representação deu ao artista da Idade Média grande liberdade para experimentar novos métodos de composição visual.
Sem esses métodos os ensinamentos da igreja nunca poderiam ter sido traduzidos em formas visíveis.

Nos séculos seguintes este tipo de representação iria conhecer novos desenvolvimentos.

Texto  escrito tendo por base o manual da Porto Editora e E. H. Gombrich 


Escultura Românica (A Cultura do Mosteiro-7)



Foi em França que as igrejas românicas começaram a ser decoradas com esculturas embora a palavra “decorar” nos possa induzir em erro.

Tudo o que pertencia à igreja tinha uma função definida e expressava uma ideia precisa relacionada com os ensinamentos da religião. O relevo foi muito usado, frequentemente relacionado com a pintura, ambos totalmente submetidos à arquitectura.

O principal objectivo da escultura era o de passar uma mensagem com funções narrativas e pedagógicas para ensinar os ignorantes que não podiam ler.

O aspecto tosco e rude dos relevos românicos revela uma nova forma de expressão que valoriza a mensagem em detrimento da técnica.

A figura humana era tratada com pouco realismo anatómico em cenas sem profundidade cuja composição se relacionava com o espaço arquitectónico que lhe servia de suporte. As figuras “encaixavam-se” uma nas outras e o conjunto adaptava-se ao suporte.

Os temas eram essencialmente religiosos mas também há muitos exemplos de representações de cenas do quotidiano ou de estranhos monstros.

Originalmente os relevos no interior das igrejas eram pintados.
Trata-se de uma arte extraordinariamente inventiva e movimentada, repleta de significado.

O relevo românico tinha uma função específica (relatar histórias) que cumpria com grande eficácia.


Na estatuária (imagens de vulto redondo) mantêm-se as principais caraterísticas verificadas no relevo. Destaca-se o tema da Virgem com o Menino.

Eram objectos de veneração concretizados em composições simples e esquemáticas.
Concebidas em função de um plano mural onde, normalmente, estavam encostadas, eram trabalhadas, principalmente, a frente e os lados da imagem.
A Virgem representa O Trono de Deus.

Texto construído a partir de E. H. Gombrich e do manual da Porto Editora

sábado, 4 de maio de 2013

O Românico - A Igreja (A Cultura do Mosteiro-6)



Nos dias de hoje não é fácil imaginar o que uma igreja significava para as pessoas na Idade Média. A igreja era, geralmente, o único edifício em pedra nas redondezas e o seu campanário um ponto de referência para todos os que vinham de longe.

Aos domingos, durante o culto, todos os habitantes da cidade aí se encontravam e o contraste entre o edifício grandioso e as casas primitiva e humildes em essas pessoas passavam a vida devia ser esmagador.

Não admira que toda a comunidade estivesse interessada na construção dessas igrejas e se orgulhasse da sua decoração. Mesmo do ponto de vista económico, a construção de um mosteiro, que levava anos, deveria transformar uma cidade inteira.

A extracção da pedra e o seu transporte, a erecção de andaimes adequados, o emprego de artífices itinerantes que traziam histórias de outras terras, tudo isso constituía um acontecimento importante nesses tempos remotos.

A Idade das Trevas não apagara por completo a lembrança das primeiras igrejas, construídas de acordo com as basílicas romanas. O plano fundamental era geralmente o mesmo: uma nave central que levava a uma abside ou coro e duas ou quatro naves colaterais.

Alguns arquitectos gostavam da ideia de construir igrejas em forma de cruz e acrescentavam uma galeria transversal entre o coro e a nave à qual se deu o nome de transepto.

Nas igrejas românicas encontramos geralmente arcos de volta inteira assentes em maciços pés-direitos. A impressão causada por essas igrejas, interna e externamente, é de grande robustez.
Poucas decorações, poucas aberturas, paredes e torres inteiriças que nos fazem lembrar fortalezas medievais.

Essas poderosas e desafiadoras montanhas de pedra erguidas pela Igreja em terras de camponeses e guerreiros recentemente convertidos do seu modo de vida pagão parecem expressar a própria ideia da Igreja militante – isto é, a ideia de que aqui, na Terra, é tarefa de Igreja combater as forças das trevas até que soe a hora do triunfo, no dia do Juízo Final.

Havia um difícil problema relacionado com a construção das igrejas que levou muito tempo a resolver: a tarefa de dar a esses impressionantes edifícios um apropriado e fiável telhado de pedra.
A arte romana de abobadar grandes edifícios exigia uma considerável soma de conhecimentos e cálculos de natureza técnica que, na sua maior parte, se tinham perdido.
Assim, os séculos XI e XII tornaram-se um período incessante de experiências.

A solução encontrada consistia em cobrir a nave principal com uma abóbada de berço.
A pressão contínua exercida pela abóbada é descarregada através de arcos para pilares e colunas que dividem as naves no interior da igreja e transmitida para as naves laterais.
Finalmente, a pressão exercida pelas abóbadas laterais é transmitida para as paredes exteriores do edifício reforçado pelas paredes grossas, com poucas aberturas, e por contrafortes situados exteriormente no mesmo alinhamento dos pilares.

domingo, 28 de abril de 2013

Proposta de trabalho 7 - pintura a acrílico


Proposta de trabalho de aula
7 textos são colocados à tua disposição.

São excertos de 7 romances ou contos de autores portugueses ou de outras nacionalidades.

Deves seleccionar um desses excertos ou, em alternativa, deves escolher um excerto de outra obra e trazê-lo na próxima aula no dia 6 de Maio.

O trabalho consiste em fazer uma ilustração desse texto recorrendo à técnica de pintura a acrílico.

Na aula de 6 de Maio deves também apresentar um esboço a grafite sobre papel (formato A4 ou A3) da imagem que irás produzir como resposta a esta proposta de trabalho.

Materiais necessários
Suporte – dadas as características das tintas acrílicas podes optar por diferentes tipos de suporte para a tua pintura: papel (o papel tipo cavalinho é desaconselhado), tela (podes reutilizar uma tela cobrindo-a com tinta plástica branca fornecida pela escola) madeira, contraplacado ou MDF.
A dimensão mínima do suporte será o tamanho A2 (42X59 cm aproximadamente).
Esta dimensão pode ser “negociada”.

Tintas acrílicas - deves ter à disposição, no mínimo, as cores primárias mais preto e branco.

Pincéis – deves ter à disposição pincéis de diferentes espessuras. Quantos mais pincéis tiveres melhor.

Recipientes para água (vidro ou plástico), paleta (madeira, plástico ou outro) e trapos para limpeza de pincéis.

Proposta de trabalho de casa
Ilustração de textos
Recorrendo à utilização da cor, executa duas ilustrações de textos escolhidos entre os 7 propostos pelo professor ou outros, da tua escolha.

Caso optes por ilustrar um texto escolhido por ti deves entregá-lo juntamente com a ilustração.

Podes optar por um suporte de tamanho A4 ou A3 – tem em atenção questões relacionadas com a composição espacial bem como com a composição cromática.

Materiais a utilizar: lápis de cor, pastel de óleo e aguarela.

1ª ilustração
Deves seleccionar um conjunto de cores frias.
2ª ilustração
Deves seleccionar um conjunto de cores quentes.
Em ambos os casos podes juntar preto e branco às cores seleccionadas.

1º entrega 13 de Maio
2º entrega 27 de Maio

Textos 


1.
Entretanto, os cavalos tinham alcançado os penedos em que se situava o castelo, e a portuguesa, depois de ter ouvido tudo, afirmou uma vez mais que queria ficar. O castelo erguia-se com seu ar de fortaleza austera. Aqui e ali, pequenas árvores retorcidas emergiam entre as rochas como cabelos esparsos. A floresta montanhosa estendia-se com tal fealdade que não seria possível descrevê-la a quem só conhecia as ondas do mar. O ar era forte e frio, e era como se se penetrasse numa cratera onde brilhasse uma luz verde.
E nas florestas havia veados, ursos, javalis, lobos e, quem sabe, unicórnios. Lá no cimo viviam os cabritos monteses e as águias. Cavernas ignoradas dariam guarida ao dragão. A floresta tinha uma profundeza de semanas a fio, atravessada apenas por veredas selvagens, e, nas serranias que se elevavam depois, era o reino dos espíritos. Ali viviam os demónios juntamente com as tempestades e as nuvens.

Robert Musil, Três Mulheres, ed. Livros do Brasil, 2011, pág. 51

2.
Um homem dos seus quarenta anos avançou porta dentro trazendo atrás de si algo e alguém. O alguém, facilmente se percebeu, era um rapazito que empurrava num carrinho de mão um objecto  – uma máquina, percebeu-se depois. Com umas moedas o rapazito desapareceu. O homem, esse, chamava-se Glasser e do seu peito saía um fio eléctrico que o ligava a uma enorme bateria, de mais de vinte quilos. Era uma bateria de camião.
                - É o meu coração artificial – explicou Glasser. – Já fazem mais pequenos mas este funciona.

Gonçalo M. Tavares, Matteo Perdeu o Emprego, ed. Porto Editora, 2010, pág. 53

                3.
Abandonei o local e prossegui o caminho. A trovoada redobrava de intensidade e o trovão rebentou por cima de mim num estrondo terrível cujo eco se repercutiu do Saléve ao Jura e aos Alpes da Sabóia. Relâmpagos que me cegavam, iluminavam o lago, dando-lhe a aparência de uma imensa planície de fogo e depois, durante um momento, tudo parecia submerso numa obscuridade completa, a tal ponto os olhos se achavam ofuscados pela luz violenta.
                Enquanto contemplava esta tempestade magnífica e terrível, ia avançando a passos rápidos. A batalha no céu arrebatava-me a alma. Pus as mãos e gritei:
                - William! Meu anjo! É o teu funeral, são os teus cantos fúnebres?
                Ao dizer estas palavras, distingui na obscuridade uma silhueta a sair furtivamente de um grupo de árvores, não longe de mim. Fiquei imóvel, fixando-a intensamente. Não podia enganar-me. Um relâmpago iluminou-a, e vi distintamente a estatura gigantesca, o corpo disforme e hediondo do miserável demónio a quem dera vida.

Mary Shelley, Frankenstein, ed. Círculo de Leitores, 1976, pág. 56-57
     
4.
Nas aulas os olhos enchiam-se-lhe de lágrimas e revolta sempre que o amigo, de boca aberta e giz a pender dos dedos, em frente ao quadro de ardósia, se mostrava incapaz de distinguir o numerador do denominador, de identificar o complemento direto e, ainda menos, o indireto, de entender a racionalidade de um número, de aplicar as propriedades das operações aritméticas, de escrever a data em francês.
                Mas nada fazia perder a fé inabalável que Duarte depositava no amigo. A certeza de que um futuro glorioso lhe estaria reservado. E o privilégio que sentia em ser seu colega de carteira enchia-lhe o peito de orgulho e gratidão. É que Duarte estava absolutamente convencido de que o Índio era um génio.
                 Perante a pobreza em que o Índio vivia, Duarte comportava-se como um verdadeiro mecenas. Com o dinheiro que amealhava em Natais e aniversários, comprava-lhe blocos de papel e lápis de várias marcas e durezas: primeiro os Viarco, depois os Faber-Castell, depois os Staedler, por fim os Caran d’Ache.

João Ricardo Pedro, O Teu Rosto Será o Último, ed. Leya, 2012, pág. 78-79

5.
                Há uns seis anos – tinha eu voltado de uma viagem e já estava aborrecido com o ócio e a rotina simples da vida doméstica, mas não aborrecido a ponto de planear uma nova expedição – fui uma noite, já tarde, interrompido na minha escrita diária por um visitante inesperado.
                Era um fulano ruivo, na primavera da vida, que tinha um estrabismo tão terrível que era difícil olhar directamente para a cara dele; para complicar as coisas ele tinha um olho verde e outro castanho. Na sua expressão a sua cara parecia combinar duas pessoas; uma, tímida e nervosa, a outra – a dominante – arrogante e agudamente cínica. Uma mistura espantosa, pois umas vezes ele olhava para mim com o olho castanho, imóvel e arregalado, e outras vezes com o verde que era comicamente revirado para cima.
                - Senhor Tichy – disse ele logo que entrou no meu gabinete – muitos trapaceiros, impostores e malucos devem importuná-lo, tentar burlá-lo ou cair-lhe em cima. Não é um facto?
                - Acontece – repliquei. – Então, o que é eu posso fazer por si?

Stanislaw Lem, Viagens de Ijon Tichy, ed. Caminho, 1987, pág. 40-41
6.
O Dragão possui a capacidade de assumir muitas formas, mas estas são inescrutáveis. Em geral, imaginam-no com cabeça de cavalo, cauda de serpente, grandes asas laterais e quatro garras, cada uma provida de quatro unhas. Fala-se mesmo das suas nove semelhanças; os cornos assemelham-se aos de um cervo, a cabeça à do camelo, os olhos aos de um demónio, o pescoço ao da serpente, o ventre ao de um molusco, as escamas às de um peixe, as garras às da águia, as plantas dos pés às do tigre e as orelhas às do boi. É habitual representá-lo com uma pérola, que lhe pende do pescoço e é o emblema do Sol. O seu poder está nessa pérola. É inofensivo se lha tiram.

Jorge Luís Borges, O Livro dos Seres Imaginários, ed. Teorema, 2009, pág. 65
7.
O frio tem mil formas e mil modos de andar no mundo: no mar corre como uma manada de cavalos, nos campos lança-se como uma praga de gafanhotos, enquanto nas cidades como lâmina de faca vai cortando as ruas infiltrando-se pelas gretas das casas sem aquecimento. Em casa de Marcovaldo naquela noite tinham acabado os últimos bocados de lenha, e a família, toda encapotada, via na salamandra empalidecerem as últimas brasas, e sair das suas bocas uma nuvem a cada respiro. Já não diziam nada; as nuvens é que falavam por eles: a mulher soltava-as longas como suspiros, os filhos sopravam-na absortos como se fossem bolas de sabão, e Marcovaldo lançava-as para o ar aos repelões como ideias luminosas que logo se desvanecem.

Italo Calvino, Marcovaldo, ed. Teorema, 1994, pág. 51