sexta-feira, 9 de fevereiro de 2007

Realismo oitocentista (Daumier)

Caricatura de Daumier por Mailly


Entre 1830 e 1870, a cul­tura francesa é atraves­sada por uma corrente unitária que se une in­dissoluvelmente aos aconteci­mentos sociais e políticos, aos entusiasmos científicos, a uma moral e a hábitos renovados. O progresso das ciências exactas, naturais, históricas gera confian­ça no método por elas utiliza­do; a economia industrial con­solida-se, dando a primazia ao capital financeiro em detri­mento da propriedade fun­diária, e facilita o nascimento do proletariado e a sua conscien­cialização como classe; as re­voluções marcam o curso das ideias democráticas e provo­cam o inevitável envolvimento do homem comum na política.

Neste contexto, o realismo oi­tocentista adquire uma fisiono­mia autónoma em relação às anteriores formas de arte ba­seadas na verosimilhança, para se afirmar como um movimen­to historicamente distinto. As premissas que conduzirão o realismo francês ao grande flo­rescimento que se seguiu à re­volução de 1848, e, por fim, à sua maturidade (que corres­pondeu à desilusão do Segun­do Império), partem da revolu­ção de Luís Filipe que coloca a monarquia, nascida de princí­pios democráticos, ao serviço de uma burguesia que surge cada vez mais como dona e se­nhora da política francesa. A fractura que se segue, entre os artistas e a classe dominante, explica-se tendo em conta duas directrizes diferentes.

Por um lado, esboça-se o compromisso político activo de um artista como Honoré Daumier que, escolhendo a litografia como principal meio de expressão, se coloca ao serviço da luta anti­monárquica através das ima­gens desenhadas para «La Ca­ricature», lendária publicação republicana fundada, em 1830, por Charles Philippon. Nas suas folhas vão-se sucedendo, até 1825, as imagens (por vezes ferozes) de que Daumier se serve para transmitir a sua mensagem moral: Gargantua, o Ventre Legislativo, A Rua Transnonain são herdeiros di­rectos dos ensinamentos de Goya. O trabalho de litógrafo é preponderante na vida de Daumier e constitui um exem­plo tão excepcional de coerên­cia que faz esquecer uma acti­vidade pictórica igualmente extraordinária.

Os temas do pintor, embora estejam menos ligados à denúncia civil do que a litografia, também são extraí­dos da vida quotidiana, mas a forma de os exprimir, abrevia­da e nervosa, está longe da que caracteriza a grande pintura realista de Millet e de Courbet, que revela o desejo de captar os traços essenciais de uma perso­nagem ou de uma cena, sem se perder nos pormenores.
Texto retirado do Guia de História da Arte, direcção de Sandro Sproccati, Ed. Presença, páginas 135-36

Em http://www.daumier.org/1.0.html encontras um sítio absolutamente extraordinário que reúne um número assombroso de imagens relativas à obra gráfica de Daumier, um artista assombroso. Entre caricaturas e cartoons podes tomar contacto com o trabalho deste artista por vezes esquecido ou menosprezado pela história da arte mas que merece uma atenção particular.
Para consultar imagens relativas à pintura de Daumier aconselho-te a "googlar", muito simplesmente, daumier. Depois é uma questão de passeares pela net à descoberta da obra deste "grande maluco"!

terça-feira, 6 de fevereiro de 2007

Manet

http://www.mystudios.com/manet/manet.html

Clica em "paintings" e terás, à esquerda, uma extensa lista de títulos de pinturas de Manet (algumas apenas com reproduções a preto e branco) apresentada por ordem cronológica. Acesso a imagens de obras (muitíssimo) pouco conhecidas ou vistas. Um "passeio" aconselhável com uma chávena de chá por companhia e boa disposição para rebuscar tão extensa lista. Esboços, estudos, naturezas-mortas, retratos, enfim, a maior reunião de imagens do mestre que alguma vez vi.

Clica sobre "The Raven" e encontrarás um trabalho de ilustração de Manet a partir do poema de Edgar Allan Poe (lembras-te de termos falado deste poema na aula?). Estarás a observar um aspecto do trabalho de Manet muito pouco divulgado. Repara na excelência dos desenhos a preto e branco. Poderás ainda ler o poema, se tiveres "tempo" e souberes inglês para a leitura.
Há mais para explorar. Segue o teu instinto!

Cinco estrelas (mais ou menos)!!!

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2007

O Salão (texto do miniguia de arte, Cézanne, ed. Köneman)

O Grand Salon no Palais de L'Industrie, 1863 (gravura da época)
"A mediocridade é aceite. As paredes são ladrilhadas com pinturas virtuosas e totalmente insignificantes. Pode-se olhar de cima para baixo, de um lado para o outro: nenhuma pintura que possa chocar, nenhuma pintura que exerça atracção. A arte foi saneada, foi cuidadosamente escovada; um bom burguês de pantufas e camisa branca."
Émile Zola


Alexandre Cabanel, O Nascimento de Vénus, 1863, pintura aceite no Salão, óleo sobre tela, 130x225cm (actualmente exposta no museu d'Orsay em Paris

As exposições de arte oficiais em Paris, no séc. XIX, chamavam-se «salons». Na sua origem, o termo designava o salão representativo de um palácio. No séc. XIX, o termo salon era igualmente utilizado para designar os espaços de exposição, tendo sido depois transposto para a exposição de arte propriamente dita. Entre os artistas vanguardistas do tempo de Cézanne, a instituição do Salão era denegrida como refúgio de tudo o que era tradicional e antiquado, pois os júris, na maioria compostos por membros da Escola das Belas-Artes ou da Academia, seguiam uma concepção da arte conservadora e académica que proibia quaisquer tentativas de inovação.
É destes salões oficiais, detestados pelos vanguardistas, que são derivadas as expressões desdenhosas ainda hoje usadas, como «arte de salão» e «pintura de salão». Uma pintura como O Nascimento de Vénus de Alexandre Cabanel, que foi exposta no Salon de 1863, fez parte das obras que conseguiram a aprovação do júri, uma vez que trata um motivo mitológico segundo os cânones da pintura académica.
Zola que, como crítico de arte, procurava chamar a atenção para as novas tendências da pintura contemporânea, não poupava o SaJon a comentários satíricos. Ao analisar o Salão de Pintura de 1866, caracterizou a composição do júri do seguinte modo:
«De um lado os colegas simpáticos, que recusam ou aceitam com indiferença; os bem sucedidos, que venceram a batalha; os artistas de ontem, que se agarram às suas convicções e não permitem qualquer inovação e, finalmente, os artistas de hoje, que conseguem pequenos êxitos com uma arte insignificante, defendendo-os com unhas e dentes, insultando e ameaçando qualquer colega que se aproxime deles.» Quando, em 1863, um número enorme de quadros foi recusado pelo Salon, tanto os artistas como a imprensa desencadearam uma campanha de protestos que levou o imperador Napoleão III a autorizar a exposição dos trabalhos recusados numa outra parte do Palais de l'lndustrie para que o público pudesse «julgar por si sobre a razão desse protesto». Este «Contra­-salão», que entrou para a história da arte com o nome de Salon des Refusés (Salão dos Recusados), provocou um escândalo que não foi menor.
Os visitantes da exposição, habituados ao academismo dominante, foram confrontados com quadros de Manet, Pissarro, Jongkind, Guillaumin, Whistler, Fantin-Latour, entre outros, sentindo-se totalmente chocados.
A imprensa atacou o Salon des Refusés com uma crítica mordaz. (…)
O Salão dos Recusados, de 1863, não voltaria a ser repetido. Nos anos que se seguiram não restou outra alternativa aos artista a não ser a de submeterem de novo, tal como era habitual, as suas obras ao Salão oficial e esperarem pelo veredicto do júri. No entanto, as obras recusadas parecem ter gerado, tal como anteriormente, uma grande atenção do público(…). Só a partir de 1884, com o Salon des Indépendants (Salão dos Independentes), se deu início em Paris a uma exposição anual de pintura independente do júri da Escola de Belas-Artes.