Caricatura de Daumier por Mailly
Entre 1830 e 1870, a cultura francesa é atravessada por uma corrente unitária que se une indissoluvelmente aos acontecimentos sociais e políticos, aos entusiasmos científicos, a uma moral e a hábitos renovados. O progresso das ciências exactas, naturais, históricas gera confiança no método por elas utilizado; a economia industrial consolida-se, dando a primazia ao capital financeiro em detrimento da propriedade fundiária, e facilita o nascimento do proletariado e a sua consciencialização como classe; as revoluções marcam o curso das ideias democráticas e provocam o inevitável envolvimento do homem comum na política.
Neste contexto, o realismo oitocentista adquire uma fisionomia autónoma em relação às anteriores formas de arte baseadas na verosimilhança, para se afirmar como um movimento historicamente distinto. As premissas que conduzirão o realismo francês ao grande florescimento que se seguiu à revolução de 1848, e, por fim, à sua maturidade (que correspondeu à desilusão do Segundo Império), partem da revolução de Luís Filipe que coloca a monarquia, nascida de princípios democráticos, ao serviço de uma burguesia que surge cada vez mais como dona e senhora da política francesa. A fractura que se segue, entre os artistas e a classe dominante, explica-se tendo em conta duas directrizes diferentes.
Por um lado, esboça-se o compromisso político activo de um artista como Honoré Daumier que, escolhendo a litografia como principal meio de expressão, se coloca ao serviço da luta antimonárquica através das imagens desenhadas para «La Caricature», lendária publicação republicana fundada, em 1830, por Charles Philippon. Nas suas folhas vão-se sucedendo, até 1825, as imagens (por vezes ferozes) de que Daumier se serve para transmitir a sua mensagem moral: Gargantua, o Ventre Legislativo, A Rua Transnonain são herdeiros directos dos ensinamentos de Goya. O trabalho de litógrafo é preponderante na vida de Daumier e constitui um exemplo tão excepcional de coerência que faz esquecer uma actividade pictórica igualmente extraordinária.
Os temas do pintor, embora estejam menos ligados à denúncia civil do que a litografia, também são extraídos da vida quotidiana, mas a forma de os exprimir, abreviada e nervosa, está longe da que caracteriza a grande pintura realista de Millet e de Courbet, que revela o desejo de captar os traços essenciais de uma personagem ou de uma cena, sem se perder nos pormenores.
Texto retirado do Guia de História da Arte, direcção de Sandro Sproccati, Ed. Presença, páginas 135-36
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