
Matisse no seu ateliê "A criatividade não é apenas uma boa ideia, é o Futuro!"
"Pintar significa provocar artísticamente um fenómeno concreto, a partir da superfície.
O pintor liga-se a um motivo que impressionou a sua sensibilidade e o seu instinto vital.
Há que tornar esse motivo «essencial», traduzindo-o em puros valores de superfícies de cor e de linha, simples e intensificados, pois o mero reflexo das impressões passageiras seria apenas um estímulo fugidio e não um valor duradoiro e essencial. Matisse esclarece como essa tradução [do motivo «essencial» em superfícies de cor e de linha] muda inteiramente as formas e as cores dadas pelo motivo e, no entanto (...) não se afasta do objecto, mas antes o
eleva a um estado ideal, pois cada elemento colorido e formal,
num debate meramente artístico com o campo de tensão que é a superfície, é levado ao ponto de irradiar pura e tranquilamente o seu
valor de eficiência, apoiado e intensificado por todos os outros elementos [da composição]."
Este texto de Walter Hess
(in Documentos Para a Compreensão da Pintura Moderna, Edição Livros do Brasil, Lisboa, págs. 66 e 67) reflecte sobre uma certa ideia de "pintura pura" patente na obra de Henri Matisse (1869-1954) em que
aquilo que é representado sobre a tela se autonomiza em relação ao motivo que lhe é exterior, atingindo a pintura um «valor essencial» que lhe é próprio e a caracteriza.
Hess prossegue a sua reflexão:
"Este
valor de eficiência é nitidamente para Matisse um
valor puro de vivacidade, de prazer, de serenidade que na superfície pode ser próprio de toda a cor e de toda a forma. (...) As cores não pretendem exprimir nem significar nada senão cor, mas, na medida em que representam de um modo inteiramente puro o seu próprio valor, acentuado pelo prazer, provocam simultaneamente de uma forma artística um fenómeno (o motivo), a partir da superfície [da tela].
Decoração e expressão tornam-se idênticas e a tensão indivíduo-mundo fica reduzida a um equilíbrio puramente estético. Matisse desenvolveu uma subtil sabedoria estética a partir do Fauvismo sem lhe enfraquecer a vitalidade original."
Podemos então concluir que Matisse "descobre" um processo criativo que torna a tela num objecto particular e artificial, que obedece a regras próprias e específicas ditadas pelo pintor, que é livre de as estabelecer de acordo com a sua sensibilidade artística.
Partindo desta premissa, o artista sente-se livre para desenvolver um jogo formal e cromático que obedece a um conjunto de regras internas, próprias daquele objecto particular, que lhe conferem a coerência necessária para satisfazer as exigências características do objecto plástico.
A questão de "reduzir" a obra de arte a um objecto decorativo não se coloca a Matisse uma vez que aquilo que orienta a sua pesquisa plástica é a busca de uma certa possibilidade de felicidade encontrada na fruição artística e não a intenção de explorar temas grandiosos ou de pendor social. Poderíamos afirmar que Matisse se interessou muito mais pela
forma do que pelo
conteúdo.