sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Uma visão pós-impressionista - Cézanne

Monte Sainte-Victoire 1885-1895



A verdade pictórica
O artista deve precaver-se contra a tendência para a literatura, que tantas vezes é motivo para que o pintor se afaste do seu verdadeiro caminho - o estudo concreto e imediato da Natureza. É falso ter uma mitologia preformada e pintá-la em vez do mundo real.

- Quando não se podem representar os reflexos da água sob a folhagem, põe-se lá uma deusa; que tem isso a ver com a água? (alusão à Fonte de Ingres). Ingres é um mau clássico. Deve-se talvez ter poesia na cabeça, mas não se deve tentar introduzi-la no quadro, se não se quer cair na literatura. Ela vem por si própria.

- O meu método é o ódio pela criação da fantasia, é o realismo, mas um realismo, entenda-se bem, cheio de grandeza, do heroísmo da realidade.

- Quando se quer forçar a Natureza à expressão, quando se torcem as árvores, se põem os rochedos a fazer caretas ou se quer refinar demasiado a expressão, isso é literatura.

- Para o pintor só as cores são verdadeiras. Antes de mais um quadro não representa nada, nem deve começar por representar coisa alguma senão cores. História, psicologia, tudo isso está, no entanto, lá, porque os pintores não são nenhuns idiotas.

- Há uma lógica das cores, que diabo, o pintor deve obdecer-lhe e não à lógica cerebral! Quando ele se perde com esta última está perdido. É com os olhos que o pintor deve perder-se. A pintura é uma óptica e a essência da nossa arte reside sobretudo naquilo que os nossos olhos pensam.

(...)

- Há uma verdade puramente pictórica das coisas.
Excertos de cartas e entrevistas de Paul Cézanne (1839-1906)
Documentos para a compreensão da Pintura Moderna, de Walter Hess, Edição de "Livros do Brasil" Lisboa, Colecção Vida e Cultura (sem data de edição)


As palavras de Cézanne conduzem-nos em direcção a uma perspectiva da pintura inovadora.
A pintura cada vez menos pretenderá copiar ou representar com fidelidade o mundo que rodeia o artista (a fotografia já é um processo de registo bastante desenvolvido nesta época).
O que Cézanne propõe é uma espécie de realismo sensorial onde o artista tenta, por todos os meios, limpar a sua pintura de elementos literários.
Ao afirmar que a pintura representa apenas cores e nada mais, Cézanne está a dar um passo em direcção a alguns princípios conceptuais que virão a ser marcantes para as gerações de artistas que lhe sucedem.
Cada vez mais se encara a arte pela arte ("A pintura é uma harmonia paralela à Natureza" Cézanne) e o objecto pictórico vai ganhando autonomia à medida que se afirma enquanto parte de um universo particular que obedece a um conjunto de regras muito próprias.
Neste sentido, Cézanne poderá ser encarado como um precursor de um conjunto de ideias que estarão na base da afirmação da arte abstracta e da arte conceptual enquanto vias de exploração para os artistas plásticos.

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